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quinta-feira, 17 de abril de 2008

DIGA COM QUEM TU ANDAS E DIREI QUEM TU ÉS! Comentário sobre aliança PT-PSDB em MG.


Marginalizados em nossa própria terra desde o “mito da fundação”, sem casa, sem terra, sem educação, bibliotecas, livros e tantos outros capitais culturais, perdemos também a memória e o sentido original das coisas. Somos facilmente manipulados como “títeres” nas mãos de falsos líderes preocupados apenas com suas benesses corporativas e interesses de umbigo.

Com a militância partidária, a manipulação ideológica não é diferente: há tempos servem de montaria para as retóricas de fariseus, políticos e sindicalistas de ocasião. Causa-me espanto que a inteligentia acadêmica de esquerda ainda chore lágrimas de crocodilo, quando o assunto é “aliança” partidária em tempos de eleição. Será a ingenuidade um apanágio hereditário de idealistas que se recusam a confrontar os fatos? Ou uma herança medieval de cunho místico e messiânico dos que ainda acreditam em "ungidos" capazes de operar a transformação social da realidade?

A impotência do Estado brasileiro tem se traduzido em políticas vicárias em doses de mandato de igual modo praticadas tanto pelo governo de FHC quanto de Lula (sempre estiveram juntos). Guiados pela lógica perversa de um mercado tirano, ambos abraçaram indulgentemente os princípios neoliberais de cunho “desenvolvimentista”.

NOLI NUOVO SUB SOLI...

Ora, por que o estranhamento, mon frère Beto?
Para quem, outrora, já defendera o “voto útil”, já se aliara com o PL e, hoje, governa barganhando cargos com o PMDB, nada de novo sob o solo da pólis. O caso é menos o de uma “metamorfose ambulante” do que a manutenção de uma ordem viciada, acostumada a ética do vale-tudo em prol da manutenção de seus privilégios. Quem está no poder, quer manter-se a qualquer custo, “doa a quem doer”. Desde a sua formação, o Estado se inscreve desde longa data num projeto de redução da diferença à semelhança, de redução do outro ao mesmo, da dissolução do múltiplo no único.



C’EST TOUT LA MÊME CHOSE..., Mon Frère Beto!
Tout la même chose...
.

Mudam-se as moscas, mas a m... continua a mesma.
Alianças ainda são feitas em função das seduções imediatistas e da ambição pelo poder, como se cada nova aliança fosse a primeira, sem qualquer espaço para a memória de erros passados, sem qualquer compromisso com a transformação social e o respeito pela dignidade humana.




Sobre esta velha opinião formada sobretudo, e sob o lacre do equívoco, que tão bem se incrustou em diferentes esferas do cotidiano, escolas, igrejas, rampas e ministérios, gravando vestígios de intolerância, racismos e preconceitos, eis a questão: teremos a coragem suficiente para esquecer o que tivemos a fraqueza de aprender? Seremos capazes de extirpá-la até a raiz?

Ora técnica, ora pomposa, e na maioria das vezes, de forma afrontada (na cara dura), essa prática carcomida e viciosa que se refestela em solo tipiniquim é o retrato de uma retórica míope que em nada se parece com a profanada "metamorfose ambulante".
É a expressão histórica e tradicional de uma mesma verbiagem oca, inútil e vã, que remonta aos tempos de colonialismo e hoje se traduz em acordos e aparatos, cristalizados à custa de hierarquias, privilégios e alienação.
Desgraçadamente, em prejuízo da RES-PÚBLICA, vem sendo perpetuados – incolumemente — ao longo de cinco séculos por quem decide o que melhor lhe convém.
Se já nos encontramos de joelhos, não resta outra coisa a fazer senão rezar...

Comentário ao texto de Frei Beto, escrito em 11-Abr-2008, reproduzido abaixo.
Por Edison Santos, USP-SP - edisonlz@usp.br - editor do site: http://clinicadotexto.blogspot.com/


PT E PSDB DE MÃOS DADAS

Nunca vi cabeça de bacalhau, mendigo careca, santo de óculos, ex-corrupto, nem filho de prostituta chamado Júnior. Nunca imaginei que, fora dos grotões, onde o compadrio prevalece sobre princípios ideológicos, veria uma aliança entre PT e PSDB. Mas o impossível acontece em Belo Horizonte, com ampla aprovação das bases petistas.
Mudei eu ou mudou o Natal? Sim, sei que Minas, onde nasci, é terra estranha, o inusitado campeia à solta: mula-sem-cabeça, lobisomem, chupa-cabra, discos voadores... Criança, vi na Praça Sete, na capital mineira, uma enorme baleia exposta à visitação pública na carroceria de uma jamanta. A Moby Dicky embalsamada exalava um forte mau cheiro que obrigou as esculturas indígenas do Edifício Acaiaca a tapar o nariz.
O que foi feito da grita do PT belo-horizontino sob oito anos de governo FHC? Em que bases programáticas a aliança se estabeleceu? Quem cedeu a quem? Quem traiu seus princípios políticos e históricos?
Lembro dos anos 50/60, quando o conservador PSD, de JK, fez aliança com o progressista PTB, de Jango. O primeiro neutralizou o segundo. E o sindicalismo, até então combativo, ingressou na era do peleguismo. No cenário internacional, o Partido Trabalhista inglês aceitou aliar-se ao Partido Republicano dos EUA. Nunca mais o inglês foi o mesmo, a ponto de apoiar a invasão do Iraque.
Só uma razão é capaz de explicar essa aproximação de pólos opostos: a lógica do poder pelo poder. Quando um partido decide que sua prioridade é assegurar a seus quadros funções de poder, e não mais representar os anseios dos pobres e promover mudanças num país de estruturas arcaicas como o Brasil, é sinal de que se deixou vencer pelas forças conservadoras. E não me surpreende que nisso conte com amplo apoio das bases, sobretudo quando se observa que a antiga militância, impregnada de utopia, cede lugar a filiados obcecados por cargos públicos.
Tenho visto, em cinco décadas de militância, como a síndrome de Jó ameaça certos políticos de esquerda. Enquanto estão fora do poder e são oposição, nutrem-se de uma coerência capaz de fazer corar são Francisco de Assis. Alçados ao poder, inicia-se o lento processo de metamorfose ambulante: princípios cedem lugar a interesses; companheiros a aliados; lutas por ideais a vitórias eleitorais.
Jó, submetido às mais duras provas, perdeu tudo, exceto a fé, suas convicções. Tais políticos, diante de um fracasso eleitoral ou perda de função pública, esquecem os princípios e valores em que acreditaram, defenderam, discursaram, escreveram e assinaram, para salvar a própria pele. Horroriza-os a perspectiva de voltarem a ser cidadãos comuns, desprovidos de mordomias e olhares bajuladores. Ainda vão à periferia, desde que como autoridades, jamais como militantes.
Talvez eu tenha ficado antigo, dinossáurico, incapaz de entender como um partido que sempre se aliou ao PFL, agora DEM, pode, de repente, sentir-se à vontade de mãos dadas com o PT. Não que tenha preconceito a peessedebistas. Sou amigo de muitos, incluído o governador José Serra. Mas quem viver verá: se o candidato da aliança PT-PSDB for eleito prefeito de Belo Horizonte, o palanque de Minas, nas eleições presidenciais de 2010, vai ser aquela saia-justa.
Minas é uma terra de mistérios: tem ouro preto, dores de indaiá, mar de Espanha, juiz de fora, rio acima e lagoa santa. E fora de Minas tenho visto coisas que já nem me espantam: Sarney e Delfim Netto apóiam Lula; o governo do PT aprova os transgênicos e a transposição do rio São Francisco; o Planalto petista revela gastos da gestão FHC e esconde os seus...
Os tempos e os costumes mudam, já diziam os latinos; as pessoas e os partidos também. Eu é que deveria ficar mudo, já que teimo em acreditar que fora da ética e dos pobres a política não tem salvação. Deve ser culpa de minha dificuldade de entender por que às vésperas de eleições todos debatem nomes de candidatos. E não propostas, programas e prioridades de governo.


Frei Betto é escritor, autor de "A mosca azul – reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros.

Fonte: Correio da Cidadania, 11.04.2008

Um comentário:

Anônimo disse...

Li o seu texto e o texto original de Frei Beto. Tenho
refletido muito hoje em dia sobre os rumos que o nosso país está tomando. Outro
dia ouvindo o Oded Grajew, ele apresentou 2 justificativas para deixar o governo
Lula. Uma foi de caráter pessoal, alegando que todos os amigos dele estavam em
São Paulo e estava triste em Brasília pela falta de amigos. A segunda, que acho
que foi o que realmente motivou sua saída, foi que o governo não investiu na
revolução ética que o país aguarda por 5 séculos! Isto decepcionou não apenas
ele, mas também todos os brasileiros que realmente desejam um país mais justo e
transparente, onde a corrupção seja de fato declarada inimiga pública número 1.
Achoq que estamos incluídos no rol de pessoas de bem que realmente desejam uma
mudança qualitativa de impacto nos rumos do país.
Até no serviço público, onde se entra por seleção rigorosa, aprende-se a ser
desonesto desde os primeiros passos. Se você chiar, entra em rota de colisão
com os mais antigos, que já se locupletam com práticas antiéticas desde tempos
imemoriais. Se você decide não compactuar com tais práticas, fica isolado como
um leproso, "metido a certo", "figura folclórica", enfim, um pária, não importa
quão justas sejam as suas demandas em prol de procedimentos éticos mais
rigorosos. Como a briga com todo um sistema de valores cristalizados é muito
desgastante, o resultado é que o seu isolamento torna-se cada vez maior,
exatamente o que o sistema deseja. Isso acontece em grau muito maior dentro da
política.
Vamos refletir sobre o atual momento político do país tendo em vista os
argumentos levantados por mim, por você, por Frei Beto e por Oded Grajew.
Podemos ser idealistas ou pragmáticos.
Vou começar pelo pragmatismo. Reza a cartilha do pragmatismo que devemos
escolher o possível, ou menos ruim, ao pior. Do ponto de vista das forças
políticas que temos hoje no Brasil com alternativas reais de poder, PSDB e PT
são as mais avançadas. É claro que é questionável o PSDB da inteligentsia
paulista ter se aliado com forças reacionárias como o PFL (atual DEM) do voto
de cabresto que ocorre nos grotões mais remotos do país. Obviamente, apesar de
não ter votado em FHC, fiquei decepcionado com o seu fisiologismo porque
esperava muito mais de um homem tão brilhante. Mas o medo de enfrentar as
elites e seus privilégios imperou e o Brasil não teve o avanço que poderia. Foi
cagaço mesmo! A governabilidade pragmática gerou todo tipo de escândalo
noticiado pela mídia. Agora, o PT também capitulou por medo de perder a
governabilidade. É verdade que o Lula está fazendo um governo muito melhor do
que o de FHC, pois foi sensível aos temas da miséria (adotou uma política que
beneficiou uma parcela considerável da população que finalmente passou a
comer!), dos investimentos do setor público (Petrobras, universidades, etc.) e
da questão do comércio exterior que nos ajudou a produzir um colchão de
reservas internacionais em dólar que está impedindo o Brasil de afundar junto
com a crise de crédito do setor imobiliário norte-americano, que arrastou
muitas economias menos preparadas para lidar com crisese externas deste tipo.
Mas não devemos nos esquecer que o LULA chamou o PMDB, que é o sucedâneo
histórico do PFL/DEM no momento atual, com um fisologismo parecido, porém muito
mais atenuado do que aquele praticado no governo FHC. Agora vem a conclusão: o
Brasil não está tão bem quanto poderia, mas certamente poderia estar muito pior
não fossem estes 2 governos de FHC e LULA na seqüência. Acredito que a
democracia vai se aperfeiçoada através da prática do voto.
Agora podemos passar ao idealismo, que é o que eu, você, Frei Beto e Oded
queremos. De fato, como falei antes, devemos procurar uma revolução ética no
país, em busca de mais transparência, mais igualdade, em suma, mais justiça
social. O país não pode ter uma justiça para o rico e outra para o pobre. O
país não pode ter um sistema educacional para o rico e outro para o pobre. O
país não pode ter um sistema de saúde para o rico e outro para o pobre. O país
não pode tolerar as condições precárias de habitação, saneamento básico, etc.
vividas pelos moradores da periferia das grandes cidades sem fazer nada! Do
contrário seremos uma Índia, que tem altas tecnologias convivendo com a miséria
ainda pior do que aquela que encontramos aqui. O Brasil é um país grande e rico,
com um povo pobre e oprimido. Se a democracia continuar no país durante,
digamos, 100 anos, a desigualdade extrema pode levar a uma desagregação cujo
prelúdio estamos vendo com a situação de casos de violência extrema que já
estão se banalizando de tanto que são noticiados na mídia. Todos pagam o preço,
pois até a classe média está presa em casa, refém da espiral de violência que
está impedindo até os amis jovens de se divertirem. O abismo social entre as
classes no Brasil está levando ao confinamento para evitar a violência gerada
pela desigualdade. É claro que a maioria da população está de acordo com este
diagnóstico, mas e os políticos testas-de-ferro dos poderosos? Esta é a origem
do medo que todos têm de governar atacando os problemas que realmente são
respoinsáveis pelas mazelas do nosso país. Enquanto não houver um governante
disposto a dar sua vida em prol de um bem maior (o bem estar e o futuro da
nossa nação), tudo vai mudar para permanecer o mesmo. Quem dera tivéssemos um
Abraham Lincoln no Brasil! Se aparecer alguém assim, o Brasil muda para melhor.
Mas desde já lhe aviso: o preço será alto, pois a elite acostumada a mandar há
500 anos não vai entregar de graça todo este poder, simplesmente porque ela não
reconhece no povo seus iguais. Isto é um problema da formação do Brasil.
O que você acha de tudo isso? Mande-me sua impressões sobre esta discussão.
Quem sabe assim não aparecem alguns "pais fundadores" para a nossa nação no
século 21?
Grande abraço,
Do amigo LEITE, de Pernambuco.